A Primeira Carta de São João (1,5-2,2) oferece a chave para compreender a festa dos Santos Inocentes, um grupo de crianças assassinadas por mandato do rei Herodes que sentia seu poder ameaçado por conta do nascimento de Jesus. A carta sublinha a existência de uma tensão permanente entre a luz e as trevas. Um «pequeno Herodes» habita em nós! De fato, «Deus é luz e nele não há trevas», nós, por outro lado, «se dissermos que não temos pecado, estamo-nos enganando a nós mesmos, e a verdade não está dentro de nós».
A ambiguidade é uma espécie de força que nos lança para direções opostas. No caso de Herodes, com medo de perder a posição de prestígio, «mandou matar todos os meninos de Belém e de todo o território vizinho, de dois anos para baixo». José, Maria e o Menino Jesus, avisados pelo Anjo do Senhor em sonho, «partiram para o Egito». A encarnação do Verbo de Deus continua sendo um sinal de que, não obstante a tragédia e a potência de morte de Herodes, a força da vida continua operando milagres!
Se pensamos na humanidade e seus dramas, na Faixa de Gaza, na Ucrânia, na Somália, em Birmânia-Myanmar, no Iêmen e mesmo nas nossas fronteiras interiores, nas relações, nas incontáveis manifestações de ódio, raiva e vingança, é possível visualizar como a «faísca de Herodes» continua acesa e pronta para incendiar com a potência do mal. A ambiguidade que está em nós deve ser assumida na sua inteireza para dar pequenos passos de encarnação. Tomar consciência dessas «trevas» interiores é o ponto de partida para dilatar os espaços de luz. É interessante que um filósofo e sociólogo de grande reconhecimento, como Edgar Morin, insistia em reconhecer que a única possibilidade para superar aambiguidade é apostar na «religação antropológica que se manifesta na solidariedade, na fraternidade, na amizade e no amor. O amor é a religação antropológica suprema».
Pe. Maicon A. Malacarne