O corajoso Papa São João XXIII, ao abrir o Concílio Vaticano II, em 11 de outubro de 1962, dizia: “uma coisa é a substância do ‘depositum fidei’, isto é, as verdades contidas na nossa doutrina, e outra é a formulação com que são enunciadas”. Sem usar Aristóteles ou grandes filosofias, poderia se traduzir assim: uma coisa é o evangelho, que não muda, outra coisa é a forma de ler, os instrumentos para aprofundar, comunicar e viver o evangelho em diferentes momentos da história.
O Concílio foi uma grande porta de diálogo da Igreja com o mundo. Do ‘ensinar a verdade’ para o ‘compartilhar as experiências diferentes e crescer juntos’, temos ainda um grande caminho a ser feito. Na próxima semana, no Vaticano, iniciará a primeira etapa do Sínodo sobre a Sinodalidade, presidida pelo Papa Francisco e com mais de 400 participantes de todos os cantos do planeta. Trata-se de um grande momento de reflexão, de partilha e de comunhão da Igreja Católica que busca sintonizar-se com a realidade dos diferentes contextos para viver a fidelidade ao evangelho e a fecundidade da Tradição que, aberta ao Espírito de Deus e ao discernimento, liga as origens da comunidade cristã com os acontecimentos de cada época.
Todo este movimento busca viver o mandato de Jesus aos doze: “enviou-os para proclamar o Reino de Deus”, diz o evangelho de hoje (Lc 9,1-6). Comunicar o evangelho significa entrar em contato com os interlocutores do evangelho. Não há anúncio do Reino sem biografias reais, histórias concretas. E as biografias mudam, os problemas de cada tempo são diferentes, as questões, dependendo do momento histórico, assumem uma maior ou menor proporção. Novos desafios aparecem.
Proclamar o Reino, portanto, não é ditar uma verdade exterior, uma norma estabelecida há centenas de anos, mas é, para usar três verbos queridos pelo Papa Francisco, acompanhar, integrar e discernir com os sujeitos envolvidos na ação. Na Exortação Apostólica Evangeli Gaudium, o Papa também escreveu: “o ser humano está sempre culturalmente situado: ‘natureza e cultura encontram-se intimamente ligadas’. A graça supõe a cultura, e o dom de Deus encarna-se na cultura de quem o recebe”.
Neste tempo, nesta pluralidade de culturas, lugar fecundo da graça, o Senhor continua pedindo: “proclama o meu amor no mundo”.
Pe. Maicon A. Malacarne