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Vida maior!

O evangelho deste domingo fala de talentos. O talento era uma moeda muito preciosa. Um talento equivalia a 6.000 dias de trabalho ou a 36 kg de ouro. A parábola conta que um homem viajou para o estrangeiro e chamou seus empregados para dividir seus bens. Para um, entregou 5 talentos, para outro, entregou 2 e, para outro, 1: «cada qual de acordo com a sua capacidade» (Mt 25,14-30). Essa expressão é fundamental porque diz que os talentos foram entregues conforme a abertura para recebê-los, não por preferência do patrão.

Acontece que quando o patrão retornou, muitos anos depois, encontrou o empregado que tinha recebido 5 talentos com 10 talentos, o que tinha recebido 2, com 4 e o que tinha recebido 1, apenas com 1: «é que fiquei com medo e escondi o talento no chão». Sobre este último, o patrão da parábola disse: «servo mau e preguiçoso».

Temos no evangelho o paradoxo da vida! De um lado, a vida em expansão, onde o 5 se abre para mais 5, o 2 para mais 2. Não é uma questão financeira. É a vida! Carregamos esse tesouro precioso, esse talento valioso, e é nossa responsabilidade fazer «render» a vida em mais vida. Do outro lado está o medo, o esconder-se, o fechamento que diminui vida!

Concluo, rezando o evangelho com a poesia de Carlos Drummond de Andrade, «Amar»:

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

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